sexta-feira, 18 de maio de 2007

Tema da Redação: Férias na Fazenda

Das quatro noites em Lancaster, decidimos que uma seria hospedados numa fazenda. Nada parecido com os hotéis-fazenda do Brasil, aqui são propriedades produtivas, que tiram o sustento da terra, a maioria produzindo leite e derivados. Em geral são casais mais velhos que vivem em grandes casas e cujos filhos ou moram em outra cidade, ou estão na faculdade ou enterrados no porão, depois de sacrificados durante um ritual religioso. Enfim, há quartos desocupados, que acabam por gerar uma renda extra.

Imaginei que seria uma boa oportunidade para interagir com as pessoas locais, dividir a mesa durante o jantar, depois ouvir sentados junto à lareira o patriarca contar histórias da guerra, com o cão labrador deitado em nossos pés e enquanto a matriarca prepara uma torta de cerejas frescas. Antes de dormir seríamos surpreendidos pela boa senhora trazendo copos de leite e cookies para garantir um sono tranquilo. E, na manhã seguinte sairia bem cedo com o velho para caçar patos ou raposas, e quando chegássemos no ponto mais alto da propriedade ele iria apontar para o horizonte e, com a voz embargada dizer: “sabe, filho, isso tudo vai ser seu um dia...”.

Com exceção dos cadáveres no porão, foi tudo diferente. Acabamos ficando numa fazenda cujos donos já haviam morado no Brasil, para onde foram como missionários religiosos. Cássia adorou poder falar português, coisa que eles faziam muito bem. Fomos recebidos com a costumeira cordialidade local, mas sem muitas delongas ou salamaleques. Nada de jantar em família, nem leite com cookies. Apenas um quarto limpo, frio e com vizinhos desconhecidos. E os fantasmas dos pobres jovens esquecidos no porão.

Na manhã seguinte, enfim um momento de comunhão. Todos os hóspedes – nós dois, um outro casal de idosos missionários e uma mulher com sua filha pré-adolescente – nos juntamos aos proprietários para um lauto desjejum, com direito a uma oração agradecendo a comida (apesar dela estar incluída na diária), dissertações individuais sobre quem éramos e o que estávamos fazendo ali e um breve recital de piano da jovem, que certamente não seguirá carreira musical. O anfitrião falou de seus dias no Brasil e teceu loas a Raul Seixas, de quem é fã incondicional, principalmente da música “Como Vovó já Dizia”, ignorando por completo o que Raulzito queria dizer com “quem não tem colírio usa óculos escuros”. Achei por bem não explicar o contexto. Fomos embora depois de ver os filtros Mellita, as latas de leite condensado, sacos de Café Pelé e outras preciosidades da culinária brasileira.

Um comentário:

Yasmim disse...

esse texto é bom