sexta-feira, 20 de março de 2009

Monsieur, s'il vous plait

Lembro de ter dito que os magnatas de outrora veraneavam em Newport, só que não entrei em detalhes. Então, aos detalhes!

No final do século XIX os Estados Unidos viviam os Anos Dourados, período em que os barões da indústria - nomes como Rockfeller, Vanderbilt, Carnegie, Melon - ganharam contornos míticos, graças ao poder e às fortunas indecentes que amealharam explorando petróleo, mineração, estradas de ferro e afins.

Ostentar era a palavra de ordem. Eles, os ricaços, elegeram Newport, para um disputa informal de quem construia a mansão mais nababesca. Mais especificamente a Avenida Bellevue, do outro lado da península, voltada para o mar aberto. Os Berwind apresentaram uma singela cópia do Chatêau d’Asnieres; os Oelrichs se inspiraram no Grand Trianon de Versailles; William Vanderbilt gastou quinze mil metros cúbicos de mármore para revestir o palacete que serviu de presente para a patrôa no seu (dela) 39° aniversário. O troféu foi para seu irmão Cornellius, com um palazzo renascentista, com nome de conjunto de R&B: The Breakers.Palmas Para Cornellius!

Algumas das mansões podem ser alugadas como locação para filmes e fotos, casamentos de popstars, festas de arromba e outros eventos perdulários, mantendo a tradição de exibicionismo e exagero do local. A maioria, no entanto, fatura oferecendo ao grande público tours guiados.Fomos conhecer os Breakers que, diga-se de passagem, cobra uma tarifa desavergonhada pelo passeio. Você acha que Cornellius, capitalista dos quatro costados, iria perder a chance de nos explorar? Nem morto!

O grupo do qual fizemos parte era composto de um punhado de ameircanos, um trio de chineses e uma família de franceses, facilmente identificáveis por serem os únicos (além de nós, que fique registrado) com as calças abaixo do umbigo. E também porque falavam francês.
A casa era realmente impressionante, mas ao contrário dos museus, não podíamos degustá-la no nosso ritmo, tinhamos que nos manter no rebanho. Passei então a prestar atenção nas pessoas do grupo. Os chineses, por exemplo, se transformaram nos chatos do passeio. A cada mudança de aposento ficavam para trás e quando presentes conversavam em voz alta. Deviam estar confabulando sobre quais objetos iriam copiar em larga escala para a venda nos camelôs de todo planeta. Os franceses, por sua vez, me fascinaram. Era uma família de seis – pai, mãe e quatro filhos. Silenciosos, atentos às explicações da guia e obedientes às regras, mesmo os dois filhos menores, crianças ainda em fase de algazarra. Mais do que o comportamento, admirava a fleuma inabalável com que ouviam a cicerone falar das obras de arte ou de móveis francêses. Ninguém da família se entreolhava, nenhum sorriso cúmplice, impassíveis. Nós, se ouvissemos o nome do Brasil - mesmo que fosse para falar de alguma doença tropical que houvesse matado um Vanderbilt com terrível sofrimento - encheríamos o peito e passaríamos o resto do tour com um sorriso orgulhoso estampado no semblante.

O passeio terminava com a visita – esta, sem controle de tempo – aos majestosos jardins do palacete onde os visitantes podiam, enfim, dar vazão ao seus ímpetos fotográficos, já que eles são proibidos no interior da mansão. Para a inevitável foto com a patrôa, não resisti à vontade de me aproximar e recorri à família gaulesa com a máquina e meu simplório francês. Queria que eles soubessem que eu era um brasileiro francófilo e aculturado. Latino americano porém limpinho. Ademais, sabemos que os franceses retribuem abordagens em inglês com suas proverbiais bufadas. O solícito patriarca, no entanto, me respondeu em inglês cristalino. Continuei pedindo em francês e ele aceitando em inglês. Não sei se era respeito por estar num país anglófono. Mais provável que fosse para me poupar do ridículo de expor minha fluência macarrônica na sua língua. Ah, como são gentis, os franceses.

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